quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

GERENCIAMENTO DE MEDICAMENTOS: NORMAS QUE SALVAM VIDAS

  Acreditação da JCI busca soluções que passam despercebidas pela Anvisa     Na última semana, o caso da menina Sthephanie dos Santos Teixeira, de apenas 12 anos, comoveu o país. Internada em um hospital de São Paulo, com dores abdominais, diarréia e vômito, teve injetada na veia vaselina, ao invés de soro fisiológico, o que ocasionou sua morte.  Dias depois, na Bahia, um bebê recebeu vacina vencida em um posto de saúde. A mãe de Rafaela, de apenas 2 meses, conta que, ao conferir a caderneta onde consta o lacre da vacina, descobriu que o medicamento estava vencido desde outubro. A criança passou mal. Os dois casos elucidam a falta de cuidados e normas das instituições de saúde com uma das questões mais importantes da administração hospitalar: o gerenciamento de medicamentos.   "Acredito que esses dois eventos, assim como vários outros ocorridos no ano, servem para atentar à necessidade de uma melhoria contínua da qualidade hospitalar", afirma Maria Manuela Alves dos Santos, superintendente do Consórcio Brasileiro de Acreditação (CBA), único representante no Brasil da Joint Commission International (JCI), maior agência do mundo em qualidade e segurança em saúde. Criado para aprimorar a qualidade hospitalar e promover um melhor atendimento ao paciente, o Manual Internacional de Acreditação da JCI trata o tema gerenciamento de medicamentos de uma forma bem abrangente, criando normas e itens até então ignorados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).  Segundo Maria Manuela, um dos itens cruciais para se evitar a troca de medicamentos é o treinamento de pessoal. Ela frisa que jornadas de trabalho extenuantes e contrárias às leis trabalhistas (que determinam uma carga horária máxima de 8 horas de trabalho diário) são extremamente prejudiciais à concentração do profissional de saúde, que fica mais suscetível a cometer erros. "Sabemos que a maior parte dos erros são cometidos nos últimos momentos da jornada de trabalho. As empresas não podem permitir que os funcionários emendem plantões em vários hospitais ou que dobrem suas escalas. Além disso, elas também devem investir em treinamento continuado e de supervisão eficiente", diz.  Outro ponto extremamente importante é a organização dos medicamentos, tanto no que diz respeito às embalagens, quanto à disposição das mesmas nas prateleiras, armários e gavetas. De acordo com a superintendente do CBA, muitas unidades de saúde deixam seus medicamentos em embalagens parecidas em locais favoráveis à mistura de componentes diferentes. "Todos os medicamentos que chegam a um hospital devem passar por uma checagem e, posteriormente, devem ser embalados e etiquetados de maneira a não serem confundidos. As identificações devem ser feitas em letras grandes e visíveis", destaca ela.   O capítulo de gerenciamento de medicamentos do Manual Internacional de Acreditação da JCI fala também sobre acondicionamento, recomendando a manutenção da medicação em uma farmácia ou almoxarifado reservado somente para isso. "Substâncias que dependem de refrigeração, têm de estar estocadas sempre na temperatura correta. Nem um grau a mais, nem um grau menos", reforça Maria Manuela, que lembra que as normas propostas pelo capítulo atentam também para um correto descarte dos medicamentos.                   

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Custo médico-hospitalar cresce 9,4% em junho




Número médio de consultas por beneficiário manteve-se constante nos últimos 12 meses, refletindo na frequência de outros procedimentos.

Em junho de 2010 a variação dos custos médicos hospitalares, VCMH/IESS, calculado pelo Instituto de Estudos de Saúde Suplementar, IESS, foi de 9,4%, após variação de 13,1% em junho de 2009, período anterior. o dobro do IPCA do período (julho09-junho10 em relação à julho08-junho09). A variação de custo acumulada nos últimos 24 meses terminados em junho de 2010 foi de 23,7%.

Após crescimento na frequência de consulta nos anos anteriores, fato que aumentou o número de consultas médias realizadas pelos beneficiários no ano, em junho de 2010 o número médio de consultas por beneficiário manteve-se constante nos últimos 12 meses. Essa constância reflete na frequência de outros procedimentos, já que, na maior parte das vezes, é na consulta que se originam as demandas pelos demais serviços de saúde. É possível que o VCMH volte a crescer ainda neste ano pela incorporação de novas atualizações no Rol de Procedimentos, que entrou em vigor em junho de 2010.

Frequência

Preço

Custo

Jun09/08

jun10/09

Jun09/08

jun10/09

Jun09/08

jun10/09

VCMH

-

-

-

-

13,1

9,4

Consulta

5,9

0,0

7,9

5,0

14,2

5,0

Exame

7,7

3,2

2,8

2,9

10,7

6,2

Terapias

18,4

11,8

-5,5

1,2

11,8

13,1

OSA

11,6

0,1

10,9

7,0

23,8

7,0

Internação

7,4

-1,8

4,8

13,0

12,5

10,9

Entende-se por Custos Médico-Hospitalares o total das despesas assistenciais pagas pelas operadoras de planos e seguros de saúde para os planos individuais. Criado pelo IESS, o VCMH é um índice que mede a variação anual dessas despesas, pela média móvel de 12 meses em relação aos dozes meses imediatamente anteriores. O custo de uma operadora de planos de saúde é formado por dois componentes, preço e frequência de uso e sua variação é o efeito combinado da variação destes dois fatores. Por exemplo, se o preço médio do procedimento cresceu 7% e a frequência de uso 3%, a variação do custo será de 10,21%. Portanto, enquanto o preço variou 7%, o custo variou 10,21%.


Fonte: Instituto de Estudos de Saúde Suplementar

09/12/2010

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Construção sustentável: sinônimo de preservação ambiental e economia administrativa

Caros Leitores,


Recebi hoje e-mail de uma amiga pedindo que divulgasse em nosso Blog a realização de um evento sobre construção verde na área de saúde; pedido este que atendi prontamente, dada a relevância do tema e a seriedade da proposta.

Uma boa leitura a todos.


No dia 14 de dezembro, o Consórcio Brasileiro de Acreditação promove a palestraConstrução Sustentável e Empreendimentos Hospitalares, que tem como foco a sustentabilidade em hospitais. Para falar sobre a importância da sustentabilidade na construção civil, arquitetura hospitalar sustentável, a certificação LEED, as barreiras do mercado e o cenário ideal, o CBA convidou o arquiteto Arthur Brito e o engenheiro Marcos Casado, que apresentarão estudos de caso do Green Building Council Brasil (GBCB), entre eles, o do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, maior edifício de saúde, do mundo, a obter a certificação LEED GOLD.

Arthur Brito que é diretor de projetos da Kahn do Brasil e atou como principal planejador hospitalar para o Plano Diretor do Hospital Israelita Albert Einstein, assegura que a certificação LEED reduz significativamente o consumo de eletricidade e de água potável. “No caso do Hospital Albert Einstein, a redução no consumo de água chegou a 35% e de energia a 15%. Isto, além de um benefício para a sociedade, representa uma economia constante para o hospital”, pondera o arquiteto, que é professor do curso Aplicação de Ferramentas de Certificação Green Building para Empreendimentos Existentes.

Gerente técnico do GBCB e coordenador dos cursos de pós-graduação da instituição, Marcos Casado, ressalta que a certificação LEED exige alta eficiência energética, uso racional da água, qualidade ambiental interna, espaços sustentáveis com boa infraestrutura urbana e tecnologias ecologicamente apropriadas. Em contrapartida, destaca os benefícios na Construção Sustentável: “Temos a redução do consumo de água entre 30 e 50%, de energia, entre 20 e 30%, resíduos desviados de aterro, de 70 a 90%, e a redução de CO2 em torno de 30%. Para implantação deste conceito há um investimento maior, em torno de 2 a 7%, com uma redução do custo operacional entre 8 e 9%, o que justifica esse investimento inicial maior.”

No entanto, Brito alerta que o momento da decisão pela certificação é um fator importante para a gestão de custos. Segundo ele, o quanto antes a instituição optar por um projeto de edifício novo ou grande reforma, mais simples será sua conquista. “Se o LEED é uma opção desde o momento da escolha do terreno, antes do início dos projetos de arquitetura e engenharia, o atendimento aos seus requisitos pode ser feito sem adição de custo à obra e com enorme potencial de redução dos custos operacionais do hospital. Já se a decisão é tomada com projetos prontos, ou obra iniciada, o desafio é enorme”, assiná-la. Especialista em administração hospitalar e em sistemas de saúde, Arthur afirma ainda que a familiaridade com o processo de acreditação da JCI/CBA pode beneficiar um hospital a conquistar uma certificação LEED. “A experiência com o Hospital Israelita Albert Einstein demonstrou que a disciplina e prática documental requeridas pela acreditação JCI auxiliam no atendimento ao processo de certificação LEED.”

A palestra Construção Sustentável e Empreendimentos Hospitalares, que acontece às 14h do dia 14 de dezembro, no auditório da Secretaria Estadual de Saúde e Defesa Civil do Rio de Janeiro, é voltada para engenheiros, arquitetos, profissionais e técnicos de saúde, e pessoas envolvidas com a proteção ao meio ambiente e a sustentabilidade. Para participar, basta doar uma lata de leite em pó ou um pacote de fraldas descartáveis nos tamanhos M ou G. As doações serão enviadas a uma instituição social para crianças. As inscrições devem ser feitas antecipadamente pelo e-mail eventos@cbacred.org.br. Mais informações através dos telefones (21)3299-8241 ou 3299-8240.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

A administração hospitalar e a acreditação


por Francisco Balestrin*

Os desafios de uma gestão hospitalar e seu reconhecimento são tema de artigo escrito pelo Vice presidente da ANAHP

"A ciência é feita de fatos, como uma casa é feita de pedras; mas uma acumulação de fatos não constitui uma ciência, como uma de pedras não faz uma casa", Henri Poincarè. Da mesma forma que um acúmulo de pedras não é uma casa, podemos refletir também que um acúmulo de profissionais, medicamentos e equipamentos tecnologicamente atualizados não constituem um hospital. O esforço institucional para transformar este conjunto de ações só toma forma e faz sentido quando empreendemos uma ação gerencial focada na qualidade e na segurança assistencial.

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De acordo com o Institute of Medicine (IOM) - dos Estados Unidos, em seu estudo Cruzando o Abismo da Qualidade: um Novo Sistema de Saúde para o Século 21 (Crossing quality chasm: a new health system for the 21st century) - um atendimento de qualidade deve sempre atender os seguintes preceitos: preocupar-se com a segurança do paciente; prover serviços de efetivos, com uso responsável dos recursos, evitando uso excessivo ou insuficiente. Além disso, manter a assistência focada no paciente, prover atendimento no tempo adequado e ser eficiente também fazem parte desta lista.

Um atendimento sem diferenças em função de características tais como gênero, etnia, condições sócio-econômicas ou localização geográfica também é um dos pontos mais importantes a serem considerados em um atendimento de excelência.

A maior parte das condições acima enumeradas não necessita de explicação, por serem de fácil percepção de todos nós. Porém, outras, sem um pequeno parêntese, não se tornam tão óbvias assim. Administrar um hospital e dar-lhe sentido técnico-operacional e econômico financeiro também é assim. Às vezes, para quem vê de fora, parece simples. No entanto, só quando se aproxima é que se percebe a enorme complexidade para dar nexo ao conjunto de ações e atividades e fazer com que sejam alcançados os objetivos descritos pelo IOM.

Um importante aliado no processo de orquestrar todas as inúmeras engrenagens que compõem a administração de uma instituição hospitalar é a Acreditação. Isto é, um processo de certificação, uma avaliação completa e objetiva de seus aspectos organizacionais, dos processos - sejam administrativos e também técnicos e operacionais - e, principalmente, de seus resultados assistenciais por uma entidade neutra, independente e especializada em qualidade.

Ao fim do processo, que pode durar até dois anos, a entidade acreditadora irá definir o quão de acordo está o hospital com os melhores padrões esperados. Um hospital Acreditado é garantia de que lá se pratica a melhor atenção médico hospitalar existente. Não devemos jamais confundir um grande e belo hospital com um hospital de excelência. Instituições de diferentes portes, sejam públicas ou privadas, podem ser acreditadas e, conseqüentemente, prover assistência de qualidade.

Segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), existem no Brasil aproximadamente 6,5 mil hospitais públicos e privados, com ou sem fins lucrativos. Destes, apenas 151 possuem algum tipo de Acreditação, de acordo com o periódico Observatório ANAHP (Associação Nacional de Hospitais Privados).

Atualmente entidades nacionais e internacionais atuam no país para acreditar hospitais. Atualmente, no Brasil existe a Organização Nacional de Acreditação (ONA). Os modelos internacionais são representados pela Joint Commission International (JCI), Accreditation Canada e National Integrated Accreditation for Healthcare Organizations (NIAHO).

Essas entidades certificam nossos hospitais como Instituições de classe mundial, aptas a receber não só pacientes nacionais, mas também um enorme fluxo de clientes internacionais, focados no turismo de saúde. A qualidade e a segurança assistencial é um dever de todos hospitais brasileiros.

*Francisco Balestrin - Vice-Presidente do Conselho Deliberativo Associação Nacional de Hospitais Privados (ANAHP)

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Glosa ainda perturba operadoras e prestadores


por Saúde Business Web**

02/11/2010
Expert afirma que relacionamento entre operadoras de planos de saúde e prestadores de serviço não pressupõe idoneidade

A glosa ainda é um tema polêmico no que concerne à relação entre operadoras de planos de saúde e prestadores de serviço. Recentemente, pesquisa divulgada pelo Datafolha revelou que cerca de 90% dos médicos paulistas declaram sofrer interferência dos planos de saúde e mais da metade (52%) afirmou que isso ocorre em todos ou na maioria dos planos.

Em seu novo post, o expert do Saúde Business Web, Adriano Loverdos, aborda esse problema. "Não existe, no relacionamento entre operadoras de planos de saúde e prestadores de serviço, o pressuposto da idoneidade. Ao contrário, infelizmente."

Loverdos destaca também as implicações resultantes dos preços dos produtos escolhidos pelos médicos.

"Quem decide quanto custa o produto que o hospital vai comprar? O fornecedor ou a fonte pagadora?Reconheço que alguns (muitos) produtos custam caro, caro demais, mas não é apenas o hospital que deve lutar contra isso."

Confira o texto na íntegra aqui.

**As opiniões dos artigos/colunistas aqui publicadas refletem unicamente a posição de seu autor, não caracterizando endosso, recomendação ou favorecimento por parte deste Blog ou quaisquer outros envolvidos na referida publicação.


quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Entendendo os Negócios em Saúde


As empresas de saúde precisam ter saúde para sobreviverem e cumprirem com seu papel. Ter saúde pode, de forma simplificada, ser entendido como ser próspero. Mas o que faz diferença neste setor para se ter um negócio próspero?

A questão é bastante ampla e complexa, pois existem muitos fatores que irão influenciar os resultados de um negócio em saúde. Sabemos sobre a necessidade de se ter custos muito bem administrados, processos e fluxos internos bem planejados e cumpridos, tecnologia apropriada de equipamentos e no uso da informação, estrutura física e recursos adequados, posicionamento de marketing e comunicação específicos, direcionamento claro das tomadas de decisão, entre outros.

Antes de continuar com essa análise, e ir direto ao que realmente entendo que faz a diferença, vale a pena uma rápida reflexão do que vem a significar ser próspero na área. De forma simplificada, é possível dizer que prosperidade é algo que traz resultados positivos para todos os stakeholders, como donos/acionistas, funcionários, médicos, pacientes, fornecedores, meio ambiente, sociedade e governo. Isso significa contribuir efetivamente para todos os envolvidos.

Como estamos falando sobre saúde, esse é um negócio que precisa efetivamente ajudar no processo de cura das pessoas. Assim, entre os muitos elementos importantes da sua gestão, dois podem fazer a diferença. O primeiro deles é a atuação (e por que não dizer, união) entre médicos e profissionais de saúde envolvidos; e o segundo elemento é a real intenção desses envolvidos.

Os estudiosos da cadeia de valor em saúde percebem que um médico costuma ter um grande poder de influência, já que é por ele que quase sempre passa a especificação e/ou o direcionamento das necessidades dos pacientes. Incentivar o melhor de cada médico envolvido é essencial para o sucesso de qualquer negócio. Para fazer isso, é importante entender a realidade desta classe profissional e o que pode ser feito para auxiliá-la. Assim como em qualquer profissão, e com a medicina não é diferente, existem profissionais que colaboram e que "atrapalham" os processos. Mais do que isso, um mesmo médico pode contribuir de um jeito ou resistir de outro, dependendo da situação. Neste momento é importante: 1) fugir de qualquer estereótipo ou julgamento; e 2) focar nas formas que podem estimular as qualidades desses profissionais. Isso pode ser feito a partir de várias ferramentas que incluem educação, diálogo, programas de relacionamento, sistemas de informação, lógica e valores de remuneração, coaching, entre outros.

Já tive a oportunidade de presenciar diversas situações de conflitos e ouvir muitas opiniões em relação aos médicos. Essas diferentes idéias, vindas de profissionais e dirigentes de empresas que atuam na área de saúde, indicam os médicos às vezes como uma solução e outras como um problema deste setor. Entendo que o médico seja parte dos dois lados em questão e, portanto, cabe aos dirigentes puxar o melhor desses profissionais para que a solução prevaleça. Diretamente relacionado a esta necessidade, temos o segundo ponto que faz a diferença nos negócios em saúde: a real intenção por detrás da empresa.

Esta intenção pode até estar expressa na missão, visão e valores da organização, mas o fato de estar escrito não significa que ela seja verdadeira. Para gerar efetivo resultado, essas idéias precisam estar incorporadas nas decisões e nos atos, principalmente naqueles oriundos da liderança. Clareza nas ações, compromisso positivo e integridade são os elementos que inspirarão os médicos e todas as pessoas envolvidas a dar o seu melhor e, assim, contribuir à cura do paciente, seja em uma atuação direta ou indireta.

A intenção "positiva" é tão importante quanto difícil, pois envolve um determinado nível de consciência das pessoas envolvidas. Nem sempre estamos maduros para reconhecer e admitir as limitações ou contradições das nossas intenções, sendo necessário um trabalho específico para que isso seja atingido. Um dos primeiros passos nesta direção é fazer um diagnóstico de todas as incoerências da empresa, já que a verdade não está naquilo que é dito, mas sim naquilo que acontece na prática. É preciso coragem para se fazer um trabalho cuja finalidade é olhar para os fatos que não condizem com as intenções. Entretanto, é daí que vem uma certeza e força de vontade para fazer o que precisa ser feito. Por si só, esta atitude inicial gera uma força que influencia no despertar da motivação interna de cada um.

De maneira concreta, entendo que a empresa, seja um hospital, um sistema pagador, uma indústria farmacêutica, um laboratório de análises clínicas, ou qualquer outra organização da área, tem que decidir para qual direção seguir, fugindo daquelas "belas frases" e daquilo que os outros gostam de ouvir. Só existe uma coisa que pode inspirar e estimular o comportamento positivo e engajado de forma perene de um diretor, de um médico e de qualquer ser humano: é a sensação da certeza de seu valor, que é o próprio valor humano na prática. O levantamento da realidade e da verdade da organização, sem busca de culpados, admitindo os problemas que acontecem, mesmo que não sejam agradáveis de se ver, é a porta de entrada para este novo ambiente.

Com um profissional e uma intenção bem equalizados, todos os outros itens necessários tendem a acontecer de forma melhor. E a combinação disso tudo junto é que vai gerar um negócio próspero na área de saúde. Se você tiver dúvidas sobre as possibilidades, uma pergunta pode ajudá-lo: em que tipo de empresa você gostaria de passar o resto de sua vida? Se você quiser fazer parte de uma empresa que privilegia o seu compromisso com as pessoas e com a intenção de ajudar na cura, então provavelmente você encontrará outros ao seu redor que também queiram. Assim, já começou o ciclo da prosperidade.

terça-feira, 26 de outubro de 2010

Médicos não podem prescrever órteses e próteses pela marca


Objetivo é reduzir os conflitos existentes entre médicos e operadoras de planos de saúde, e também com instituições públicas

O Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou resolução que veda aos médicos a indicação expressa de marca comercial quando prescreverem órteses, próteses ou materiais implantáveis. De acordo com a norma, cabe ao médico determinar as características dos produtos (tipo, matéria prima e dimensões, por exemplo), mas as opções devem ser justificadas clinicamente.

De acordo com o conselheiro Antônio Pinheiro, coordenador da comissão que elaborou a resolução, o objetivo é reduzir os conflitos existentes entre médicos e operadoras de planos de saúde, e também com instituições públicas. Além disso,evitar que médicos requisitem produtos de determinadas marcas em troca de benefícios eventualmente oferecidos por fabricantes.

As autorizações e as negativas de fornecimento do material requisitado deverão ser acompanhadas do parecer de um médico, identificado por nome e número de inscrição profissional no CRM - tanto em operadoras de planos de saúde quanto em instituições públicas.

Ainda segundo o CFM, quando julgar inadequado ou deficiente o material implantável ou o instrumental oferecido, o médico requisitante poderá recusá-lo e indicar à operadora ou instituição pública pelo menos três marcas, quando possível de diferentes fabricantes diferentes - os produtos devem ser considerados regulares pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e correspondentes às características especificadas previamente.

A recusa deve ser documentada e, se o motivo for deficiência ou defeito material, os documentos devem ser encaminhados pelo médico ou pelo diretor técnico da instituição hospitalar à Anvisa, diretamente ou por meio da Câmara Técnica de implantes da Associação Médica Brasileira (AMB).

Se persistir a divergência entre o médico requisitante e a operadora do plano de saúde (ou a instituição pública), deverá, de comum acordo, ser escolhido um árbitro para decidir no caso - médico especialista na área, que será remunerado pelo trabalho. A decisão deverá ser tomada em até cinco dias úteis, a contar da data de conhecimento da questão pelo responsável pela arbitragem. Segue, abaixo, a resolução em sua íntegra:

RESOLUÇÃO CFM N° 1.956/2010

(Publicada no D.O.U., de 25 de outubro de 2010, Seção I, p. 126)
Disciplina a prescrição de materiais implantáveis, órteses e próteses e determina arbitragem de especialista quando houver conflito.
O CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA, no uso das atribuições conferidas pela Lei n° 3.268, de 30 de setembro de 1957, regulamentada pelo Decreto n° 44.045, de 19 de julho de 1958, respectiva e posteriormente alterada pela Lei n° 11.000, de 15 de dezembro de 2004, e Decreto n° 6.821, de 14 de abril de 2009, e
CONSIDERANDO que o médico deve, em benefício do seu paciente, agir com o máximo de zelo e o melhor de sua capacidade;
CONSIDERANDO que o médico não pode renunciar à sua liberdade profissional, evitando que quaisquer restrições ou imposições possam prejudicar a eficácia e a correção de seu trabalho;
CONSIDERANDO que para tal deve aprimorar-se continuamente quanto aos seus conhecimentos técnicos e ao progresso da ciência médica;
CONSIDERANDO que é direito do médico indicar o procedimento adequado ao paciente, observadas as práticas reconhecidamente aceitas e respeitadas as normas legais vigentes no país;
CONSIDERANDO que é dever do médico utilizar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento a seu alcance em favor do paciente;
CONSIDERANDO que a Resolução CFM nº 1.614/01 disciplina a função de auditoria médica;
CONSIDERANDO que é imperiosa a garantia de acesso aos médicos e, por conseguinte, aos pacientes, da evolução tecnológica comprovada cientificamente e liberada para uso no país;
CONSIDERANDO que é vedado ao médico obter qualquer forma de lucro ou vantagem pela comercialização de medicamentos, órteses, próteses, materiais especiais ou artigos implantáveis de qualquer natureza, cuja compra decorra de influência direta em virtude de sua atividade profissional;
CONSIDERANDO que reconhecidamente há conflitos de ordens diversas entre médicos assistentes e operadoras de planos de saúde, como também instituições públicas da área, quando da indicação para uso de órteses, próteses e materiais implantáveis;
CONSIDERANDO que, de acordo com a Resolução CFM n° 1.804/06, os artigos implantáveis são utilizados sob a supervisão e responsabilidade do diretor técnico do hospital ou outro médico por ele indicado;
CONSIDERANDO a necessidade de declaração de conflito de interesses na área de pesquisa, produção científica e educação continuada para maior transparência e imparcialidade na atividade profissional;
CONSIDERANDO que deve ser respeitado o direito do paciente em receber informações quanto ao seu diagnóstico, prognóstico, riscos e objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, devendo, neste caso, ser feita a comunicação a seu representante legal;
CONSIDERANDO, finalmente, o decidido na sessão plenária realizada em 7 de outubro de 2010,
RESOLVE:
Art. 1° Cabe ao médico assistente determinar as características (tipo, matéria-prima, dimensões) das órteses, próteses e materiais especiais implantáveis, bem como o instrumental compatível, necessário e adequado à execução do procedimento.
Art. 2° O médico assistente requisitante deve justificar clinicamente a sua indicação, observadas as práticas cientificamente reconhecidas e as legislações vigentes no país.
Art. 3° É vedado ao médico assistente requisitante exigir fornecedor ou marca comercial exclusivos.
Art. 4° As autorizações ou negativas devem ser acompanhadas de parecer identificado com o nome e número de inscrição no Conselho Regional de Medicina do médico responsável pelo mesmo.
Art. 5° O médico assistente requisitante pode, quando julgar inadequado ou deficiente o material implantável, bem como o instrumental disponibilizado, recusá-los e oferecer à operadora ou instituição pública pelo menos três marcas de produtos de fabricantes diferentes, quando disponíveis, regularizados juntos à Anvisa e que atendam às características previamente especificadas.
Parágrafo único. Nesta circunstância, a recusa deve ser documentada e se o motivo for a deficiência ou o defeito material a documentação deve ser encaminhada pelo médico assistente ou pelo diretor técnico da instituição hospitalar diretamente à Anvisa, ou por meio da câmara técnica de implantes da AMB (implantes@amb.org.br), para as providências cabíveis.
Art. 6° Caso persista a divergência entre o médico assistente requisitante e a operadora ou instituição pública, deverá, de comum acordo, ser escolhido um médico especialista na área, para a decisão.
§ 1° Esta decisão não deverá ultrapassar o prazo de cinco dias úteis, contados a partir do conhecimento do responsável pela arbitragem.
§ 2° Cabe arbitragem mesmo nas situações de emergências, quando não for possível pré-autorização e tenha sido usado o material implantável, órtese ou prótese.
§ 3º O médico que atua como árbitro tem direito a remuneração.
Art. 7º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação e revoga os dispositivos em contrário.
Brasília-DF, 7 de outubro de 2010

ROBERTO LUIZ D'AVILA HENRIQUE BATISTA E SILVA
Presidente Secretário-geral


terça-feira, 19 de outubro de 2010

Valor e qualidade ao paciente como novo desafio da gestão em saúde

Publico, na íntegra, a entrevista do Guru da Estratégia, Michael Porter, à revista EXAME, edição 907 / Ano 41 Nº23 em 05/12/07; falando deste novo modelo competitivo.

A palestra de Porter encerrou em grande estilo o terceiro e último encontro de Repensando a Saúde, evento promovido pela Amil com o objetivo de discutir problemas e apontar soluções para aprimorar o sistema brasileiro de saúde. Nas duas primeiras etapas – realizadas em julho e setembro, em São Paulo e no Rio de Janeiro – os principais agentes do setor protagonizaram os debates. E parte desta reflexão foi levada a Porter, que após sua exposição respondeu a perguntas formuladas por Antonio Jorge Kropt, diretor técnico da Amil Brasil, que atuou como mediador nas três etapas do projeto. Nas páginas seguintes, além de um resumo das instigantes idéias debatidas no evento, você terá a oportunidade de ler uma entrevista exclusiva com Michael Porter, na qual ela defende a necessidade de colocar a teoria em prática e, assim, “fazer acontecer”.

A primeira apresentação coube a Rob Dhole, presidente da divisão de saúde do Omnicom Group, conglomerado de comunicação e marketing que atua em mais de cem países e controla algumas das maiores agências especializadas em saúde. “Há duas coisas que não devem ser feitas numa palestra”, disse Dhole, olhando para o relógio. “Uma é falar quando estão todos com fome, a outra é falar sobre estratégia antes de Michael Porter.”

Embora tenha tomado base seu livro sobre competição no setor, Porter incluiu insights sobre o modelo brasileiro de saúde em sua palestra.

Foi a senha para ganhar a simpatia da audiência para sua exposição sobre o papel da propaganda como força complementar às campanhas públicas que informam a população sobre prevenção e cuidados com a saúde. “Informações para os pacientes são fundamentais, mas a motivação vem da estratégia e da arte de uma boa propaganda”, afirmou Dhole, para quem questões de foro pessoal, como parar de fumar, são mais difíceis de combater. “Será que sempre cuidamos de nossa saúde como deveríamos: Com um estímulo grande e uma boa propaganda é bem mais fácil. Alguns anúncios são nitidamente de ajuda pública”, concluiu ele.

MODELO ANALÍTICO

Presidente do Grupo Amil e autor da apresentação da edição brasileira do livro de Porter sobre a saúde, Edson Bueno subiu ao palco para dar as boas vindas ao aguardado convidado da noite. “Não existe maneira de fazer qualquer análise no sistema de saúde sem passar pelo modelo Porter”, disse Bueno, antes de anunciar aquele que “é considerado o estrategista e guru número um da atualidade.”

Entre tímido e vaidoso, como a maioria dos intelectuais, Porter agradeceu os elogios, olhou rapidamente para o horizonte e logo deu início à sua densa exposição da necessidade de adotar uma nova perspectiva para encarar a saúde, com foco na geração de valor ao paciente. “As pessoas querem saúde, e não o sistema de saúde, remédios e tratamentos. O problema é que não estamos organizados para oferecer um atendimento melhor. Estamos prestando os serviços de forma arcaica e ineficiente, com um pensamento empresarial de séculos atrás”, afirmou. “O Brasil tem médicos, hospitais e remédios ótimos. Mas falta estratégia, visão de como transformar a saúde no país, produzindo os resultados que precisamos.”

Porter acredita ser possível transformar o sistema de saúde não apenas no Brasil, mas em qualquer país. Segundo ele, para isso é preciso mudar a organização do sistema como um todo, sempre tendo em vista a geração do valor. Na opinião do acadêmico, hoje aquilo que o paciente recebe não é suficiente em comparação ao dinheiro gasto.

Afinal, o que deve ser feito para melhorar o valor e diminuir os gastos? Para Porter, cortar custos não é a melhor maneira de solucionar o problema. Mas sim oferecer saúde de melhor qualidade. “O nível de saúde tem de ser melhor para o avanço de todo o sistema. Prevenção, impedir que as doenças aconteçam – vacinas, campanhas, detecção precoce -,isso é bem mais barato e eficiente. Se a doença é descoberta tarde, é muito mais caro e debilitante para o paciente e todo o sistema.”

VISÃO INTEGRADA

Embora defenda a cobertura universal da saúde pelos seguros privados como essencial para o bom funcionamento do sistema, Porter acredita que isso não basta, uma vez que não garante a reforma estrutural do setor de cuidados com a saúde. “O problema é mais profundo e diz respeito ao valor real do serviço prestado”, conceitua. Um de seus argumentos centrais é que a política de incentivos no sistema de saúde está equivocada. “O médico hoje não é recompensado por oferecer valor, nem as seguradoras. A concorrência é de soma zero, não cria valor e ninguém ganha. Assim os serviços ficam restritos e não se tem solução.”

Para ele, o fim da soma zero requer uma mudança de atitude. “Hoje o médico é pago por atendimento, e não por reduzir preços e aumentar valor, o que está muito errado. Precisamos unir esforços para competir e gerar valor para o paciente, melhorando assim todo o sistema.”, defende Porter, para quem a organização da prestação de serviços é a única maneira de oferecer valor ao paciente.

Isso passa, necessariamente, por uma nova visão do sistema, mais integrada, na qual os atendimentos e cuidados com a saúde devem estar coordenados e interligados para tratar o paciente ao longo do tempo. “Assim, pode-se gerar bons resultados para os pacientes e custos mais baixos, ou seja, uma performance eficiente.”

Na opinião de Porter, é preciso haver um ciclo de atendimento para todas as patologias: prevenção, triagem, diagnóstico, tratamento. E, claro, bom gerenciamento. A adoção de uma nova perspectiva sistêmica, de longo prazo, permitiria investir no ciclo de tratamento, com benefícios para todos. “O ciclo tem de ter equipes dedicadas a tratar bem o paciente e combater o sistema fragmentado que existe hoje”, explica ele, para quem a concorrência entre os prestadores de serviços deve ser regional e nacional, não apenas local.”O sistema deve, sim, estar mais próximo dos pacientes, mas a concorrência deve ser mais ampla.” Porter acredita que o uso da tecnologia da informação pode ajudar nesse sentido, oferecendo acesso universal a prontuários eletrônicos, melhor coordenação e possibilidade de acompanhamento de todos. “O Brasil entendeu essa questão e já tem boas iniciativas nesse sentido.”, elogiou.

Depois de dizer que a tomada de decisões estratégicas não pode ser feita com base em conveniências – até porque o consumidor, maior interessado na própria saúde, está cada vez mais exigente -, Porter aproveitou para provocar os gestores brasileiros da área da saúde. “Alguns líderes brasileiros pensam que pagando mal aos médicos estão fazendo um ótimo negócio, mas aí o profissional tem de correr, arranjar três empregos, e atende os pacientes de maneira rápida e pouco eficiente. Isso causa a soma zero.”, resumiu ele, defendendo a necessidade de mudar o sistema. “Mas estou otimista”, concluiu, ao comentar que muitas iniciativas positivas de mudança na área da saúde têm ocorrido em diversos setores e em vários países.

Logo que terminou sua exposição, o pesquisador americano, que atua como consultor de empresa e governos, respondeu a questões complexas que surgiram nas duas etapas anteriores do evento Repensando a Saúde. Formuladas por Antonio Jorge Kropf, diretor técnico da Amil, as perguntas permitiram ampliar a reflexão sobre os numerosos desafios que estão na ordem do dia dos profissionais da saúde – desde como aplicar o conceito de valor de paciente crônico em fase terminal até como mudar o atual modelo de remuneração do sistema.

Um dos temas abordados foi como lidar com a informação médica, considerando o direito do paciente à privacidade e a necessidade do sistema de dispor de informações confiáveis para oferecer um tratamento melhor. Porter defendeu uma abordagem similar a que rege o sigilo bancário, com o uso de senhas por exemplo. Embora reconheça que existam riscos de má utilização dessas informações, ele afirma que devemos confiar na tecnologia computacional. Afinal, sustenta, “o risco de receber um cuidado ruim é maior que o de perder a privacidade.”

Outra questão polêmica levantada foi como convencer os pacientes e demais envolvidos no sistema de saúde sobre o valor do atendimento primário, em unidades integradas de atendimento. Para Porter, o atendimento primário é o que tem maior valor em qualquer sistema de saúde. “No Brasil muita gente não passa por um atendimento primário e vai direto a um especialista, às vezes por motivos errados. Na Suécia e na Alemanha, onde os resultados são bons e os custos baixos, o que torna os sistemas de saúde eficientes é o fácil acesso e a alta qualidade do atendimento primário.” Ainda assim, Porter defendeu que mesmo os cuidados primários devem ter algum tipo de especialização e citou o bem-sucedido modelo adotado pelos países escandinavos.

Promover mudanças profundas não demanda apenas conhecimento e determinação. Muitas vezes a maior barreira a superar é de ordem cultural. “Tenho certeza que você será um dos líderes desse processo no Brasil.”, disse Porter a Antonio Jorge. “Os planos de saúde nos Estados Unidos estão encarando a mudança de uma maneira muito lenta. Eles estão sofrendo para mudar de mentalidade”, disse Porter, para quem a tendência ainda é fazer com que o consumidor pague mais. “Queremos tomar remédios? Queremos ir ao médico? Claro que não! O que queremos é jogar golfe”, concluiu ele, arrancando risos de cumplicidade da platéia.

QUESTÃO DE PRINCÍPIO

“O desafio agora não é mais a radiografia do sistema. A teoria está posta. A tarefa agora é fazer acontecer”, afirma Michael Porter

Em 2004, quando publicou, com Elizabeth Teisberg, um artigo sobre competição no sistema de saúde, Michael Porter achou que não voltaria mais ao assunto. “Estava pessimista. Parecia impossível promover as mudanças necessárias.” Felizmente ele estava errado: nesses três anos, não apenas aprofundou o estudo da saúde como entrou em contato com experiências bem-sucedidas de reestruturação no setor. E foi para falar sobre sua visão estratégica de saúde que Porter abriu uma brecha em sua concorrida agenda e nos concedeu a seguinte entrevista exclusiva.

Se, como o senhor afirma, saúde de qualidade custa menos, não haverá, a longo prazo, menos dinheiro no sistema?

Não devemos assumir que o dinheiro é fixo ou diminuirá. O Brasil, por exemplo, ainda gasta pouco em saúde comparado com outros países. E está se tornando mais rico, o padrão de vida das pessoas vem aumentando. É provável que o país venha a gastar mais com a saúde. E talvez devesse, pois há muitos brasileiros que não tem acesso a bons cuidados. Acho natural que, à medida que uma sociedade enriquece, gaste mais com a saúde.

O senhor tem estudado a saúde em diferentes países. O que aprendeu com esta experiência? Existe um modelo único de sucesso?

Eu acho que é um pouco como a Teoria das Cindo Forças (modelo competitivo criado por Porter em 1979). Não há um único modelo, que se possa dizer: aplique-o a todos os países. O que vemos é que há alguns princípios. Existem princípios sobre o sistema de seguros, sobre como definir cobertura, sobre como fornecedores devem estruturar suas operações, princípios sobre planos de saúde. Toda situação será sempre um pouco diferente, mas passei a acreditar que existem princípios de valor que são universais. Eles se aplicam à Suécia, à Suíça...

Mesmo para sistemas públicos?

Sim. Acreditamos que o fato do sistema ser privado ou governamental não é importante. Trata-se de algo quase secundário. O que importa é como o cuidado à saúde é organizado, a natureza dos reembolsos, a habilidade de integrar o tratamento ao longo do ciclo. Descobrimos que há surpreendentemente pequenas diferenças entre público e privado, nesse campo. Então nosso foco recaiu nos princípios que alinham a entrega da saúde com valor.

E, quanto ao pagamento dos profissionais e das empresas da área da saúde, faz diferença o sistema ser público, privado ou misto?

No Japão, os seguros são provados, alguns dos hospitais são públicos e outros privados. Na Holanda. Muitas partes do sistema são particulares, mas os seguros são públicos. Existe todo tipo de mix. Não é tanto o caso de quem paga quem, mas como se paga. Falamos muito sobre o modelo de pagamento por serviço, que não funciona.

Explique melhor, por favor.

Não importa se você é o governo brasileiro pagando a taxa por serviço do SUS, ou se é o Medicare dos Estados Unidos pagando uma taxa por serviço a um hospital particular. É o modelo de pagamento por serviço que está equivocado, não quem paga. Nós acreditamos que os princípios que organizam a saúde se aplicam a todo tipo de sistema, não importa quem seja seu dono. O desafio é partir de onde se está hoje para as modificações. Os desafios de implementação no Reino Unido, onde a maior parte do sistema é operada pelo governo, são distintos dos de Taiwan, por exemplo, onde muitos dos hospitais são privados.

O senhor poderia resumir estes desafios?

O desafio agora não é a radiografia do sistema. O desafio real é a implementação. Como você de fato mede resultados, coleta dados, verifica e publica essas informações, como ajusta o risco... Acho que são questões organizacionais, técnicas e médicas. Tenho um colega em Harvard – Jim Kim, um reconhecido líder em saúde global - que diz que precisamos criar uma nova ciência da entrega. Não sei se devemos chamá-la assim, mas acredito que ele está certo. Acho que a ciência médica evoluiu muito mais do que as organizações, em termos estratégicos. Acho que uma reestruturação é necessária.

E o que pode ser feito nesse sentido?

Agora a tarefa não é a teoria, pois a teoria está posta. A tarefa agora é fazer acontecer. Vou dar um curso em janeiro, em Harvard, sobre a entrega de valor em saúde, com dez bem-sucedidos estudos de caso. Daí entenderemos melhor como as coisas funcionam.